Sr.
Dix e a Estranha Abdução da Garota que Ninguém Conhece
Primo Dix manejou suavemente os
controles de sua nave, aterrissando com um silêncio digno de um prêmio no
jardim calmíssimo de uma pequena casa em São Paulo. Ele abriu a rampa de saída
e um pouco da névoa do plasma do motor se avolumou por sobre a grama.
Escondeu-se atrás de uma grossa árvore
nativa e ativou o modo de invisibilidade de sua nave, admirando o interior da
casa. Ele tinha interceptado sem querer um sinal da Segurança do Conselho
Intergaláctico que apontava diretamente para a direção daquela casa sem graça e
estranhando o que alguém que morasse ali pudesse significar para o onipotente
Conselho, ele se sentiu na obrigação de espionar.
Um momento depois e ele assistiu um
grupo em um SUV invadir a casa e logo depois levar uma moça desacordada
consigo. Seu escâner de assinaturas magnéticas apitou e ele decodificou
facilmente o sinal que estava sendo enviado para a localização, fazendo um
arrepio estranho invadir a corrente sanguínea de Dix.
Ele digitou manualmente o código da
assinatura no Almanaque do Universo e rapidamente um nome surgiu, mostrando a
foto nada amigável de Juniper Lokason — um homem ruivo, nos meados dos seus
trinta anos, com um nariz do tamanho de um planeta e um ego que dificilmente
caberia nesse mesmo planeta.
O problema em questão não era seu ego
de dimensões admiráveis, mas o fato de que ele era um dos feiticeiros mais
diabólicos que a galáxia já tinha conhecido, um pouco mais que Darth Vader e um
pouco menos que a Bruxa Má do Oeste. Ele fechou seu Almanaque e esperou o silêncio
reinar novamente, invadindo a casa à passo leves.
Todos os humanos da casa ainda dormiam
como se nada tivesse acontecido. Aquela menina iria entrar para a lista de
desaparecimentos inexplicáveis e a polícia com o tempo iria convidar o casal a
simplesmente esquecer o caso. Curiosamente, quando ele entrou em seu quarto
percebeu que seu notebook estava aberto em uma notícia cujo título dizia que a
Nasa acusava um alienígena de estar disfarçado no Brasil se escondendo.
Dix riu suavemente, podia apontar uns
trinta mil sujeitos que não tinham nascido na Terra e estavam passeando felizes
e contentes pelo Brasil, com a desculpa de serem turistas. Nada que um aplicativo
de linguagem não resolvesse e aprender português era ridiculamente fácil.
Dix, como todos esses caras felizes,
não tinha nascido na Terra, o que não o impedia de dar umas voltinhas pelas
bandas e provavelmente não era o único naquele momento à fazer uma pequena
visita à São Paulo por conta daquela perturbação causada pelo furacão Juniper.
Ele puxou seu controle portátil da
nave e ordenou:
— Computador, encontrar presenças
alienígenas da União Yggdrasil nas proximidades, respeitar raio de dez
quilômetros — quando ele terminou, o controle acionou uma luz verde,
sinalizando que estava acatando a ordem.
—
Há alguma distância dali —
Os
passos ecoaram pelo silêncio úmido da rua sem saída, cercada de prédios velhos
e saídas ainda mais velhas, enquanto espirais de vapor emergiam dos bueiros e
dos encanamentos expostos. Os últimos resquícios de uma garoa fina se
avolumavam pelos cantos das calçadas e escorriam entre os tijolos.
Lugus
Calandra, também nem perto de ter nascido na Terra, puxou seu escâner de calor
de dentro do bolso de seu casaco e vasculhou o local, procurando pelos guardas
escondidos nos cantos, detectando as manchas vermelhas amareladas atrás das paredes,
caminhando nervosamente de um lado para o outro no espaço limitado onde estavam
temporariamente trancados.
Uma
das manchas permanecia estável, provavelmente deitada em uma cama e expondo um
marcador, que mostrava que era essencialmente nessa que estava interessado.
Seu
rosto era protegido por uma barreira de energia que lhe fornecia oxigênio, informações
e características dos objetos que o rodeava e o modo como seus olhos giravam
imensamente azuis de um lado para o outro demonstrava que seu ultimo interesse
era justamente os perigos que aquele lugar poderia lhe oferecer.
Às
suas costas um segundo homem se aproximou, com cabelos castanhos que desciam
sobre seus ombros, orelhas pontudas e traços fortes. Seus olhos castanhos
desceram sobre a imagem do escâner e suas sobrancelhas se franziram.
—
Ela está lá dentro — ele disse à Lugus — está cercada por três guardas com
armamento classe 5. Seus sensores estão ligados?
—
Sempre Galather — o loiro sorriu, movendo seus olhos impressionamente azuis
para o outro — vou entrar — e puxou do coldre pendurado em seu quadril o punho
prateado de uma espada, acionando os botões corretos e liberando a lâmina
laser.
Antes
que o outro pudesse responder, ele se encaminhou para a porta a sua frente,
expulsando alguns gatos de seu caminho e com um golpe pesado de seu pé sobre o
metal a porta pendeu sonoramente para o chão, chamando a atenção dos guardas no
interior do prédio.
Só
precisou de alguns segundos para que seus sensores os detectassem, analisando
suas possíveis fraquezas. O som de uma metralhadora sendo engatilhada chamou
sua atenção e um pequeno momento depois os tiros foram cuspidos pela arma.
Moveu-se,
girando a espada em seu punho, acionando um comando e liberando um escudo de
proteção que derretia as baldas que vinham em seu caminho. Às suas costas duas
esferas de plasma assoviaram pelo ar, cortando a sala e se chocando contra os outros
dois guardas restantes.
Os
seus corpos penderam frouxamente para o chão e o que ainda se mantinha em pé
moveu a metralhadora com ainda mais desespero.
Quando
ele mudou a direção dos tiros para fora de seu alcance, balançando a arma,
Lugus saltou girando a espada no ar e com um golpe gracioso, a cabeça de seu
inimigo foi cortada de seu pescoço, rolando pelo chão até se juntar aos outros
corpos.
— / —
Dix assistiu admiradamente enquanto
dois elfos carregavam a moça para fora e embarcavam em uma nave feia demais
para ser verdade, sem que ninguém na metrópole percebesse e literalmente por
cima dos cadáveres da Segurança Intergaláctica. Puxou o controle portátil e
acionou a câmera e filmou toda a abdução.
Quando estava pronto para devolver o
dispositivo ao seu bolso, ele sentiu o cano gelado de uma arma se encostar ao
seu pescoço rigidamente e ele virou apenas um pouco seu rosto, com um sorriso
constrangido para saber quem pretendia matá-lo. Um dos agentes da Segurança que
tinham invadido a casa da garota lhe lançou um olhar de profunda raiva.
— Me passe esse celular estranho — e
ergueu a mão, onde Dix colocou o dispositivo sem pressa — conhece aqueles
malditos alienígenas? — Ele lançou um olhar para a nave que já desparecia no
escuro da noite e Dix lhe sorriu um pouco mais feliz agora.
— Que tal minha liberdade pela
informação? Começando por tirar essa pistola da minha nuca?
D. abaixou a arma desgostosamente.
— Aqueles dois elfos são da União
Yggdrasil e acho que estão levando aquela garota justamente para quem vocês
estavam loucos para mantê-la longe.
— O
que? — D. engasgou — mas não sabemos ainda o que está acontecendo.
Dix deu de ombros suavemente e ajeitou
seu terno em desalinho.
— Acho que estamos prestes a descobrir
do pior jeito.
Claro
que não é o Fim.
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