E vamos, pouco a pouco, nos enchendo de um vazio que não é preenchido mais facilmente, num desconfortável acomodamento e num estado de desesperança e de vitimização no atual estado das coisas.
Acho que, de certa forma, essa é uma forma de escapismo; se pôr na condição de vítima, de inocente, de perseguido pela vida e por seus acontecimentos. Na realidade, cruéis somos nós conosco; é mais cômodo talvez reclamar do que nos acontece do que aquilo que fazemos para que nos aconteça o que nos acomete. Pensei nisso quando andava pelas ruas e vi um homem parado, fumando, e presa à sua cintura havia uma sonda, já com um pouco de líquido amarelo. Pensei nas coisas da minha vida, nas coisas e sentimentos ruins, nesse meu vazio, nesse meu desamor, nessa minha dolorosa solidão, e pensei que, se além de tudo, eu ainda tivesse que usar um troço daquele na minha cintura, sugando minha urina, ou se eu não tivesse parte do meu corpo, se fosse cego, ou paraplégico, ou qualquer outro tipo de deficiência ou infortúnio que deus, vez por outra, por seus misteriosos e insondáveis motivos nos impõe.
Nessas horas a gente se sente até mal por ver que nossos problemas são menores do que os vemos. É claro que todos temos o direito de nos sentirmos mal, tristes e melancólicos. Se temos o direito de sermos felizes, também temos o direito de nos resguardar na dor e na amargura que nos toma o coração em certos momentos da vida.
Detesto quem diz que temos de ser alegres só porque existem pessoas em situações piores e continuam alegres e felizes. Sinceramente, o que os outros sentem não me interessa, assim como, já percebi, não interessa aos outros o meu sofrimento; pelo contrário, cada vez mais as pessoas estão se fechando em seus mundinhos egoístas e pouco se importando com o mundo ao redor.
Mas, sempre é bom ver o mundo com um olhar mais amplo, vendo o todo, assim, quem sabe, às vezes, a gente possa relativizar as coisas que parecem tão ruins.
É possível rir de tudo, inclusive, e principalmente, das nossas próprias agruras.