8 de setembro de 2015

SONHOS X INSÔNIAS





Eu me lembro dos anos 60 e 70, quando não via a hora de chegar o final de semana para poder jogar futebol. Sete e meia da manhã, antes que chegassem os times juvenis e veteranos, vestíamos nosso fardamento surrado do Corintinha da Vila Anastácio e íamos jogar até as dez horas.
Senhor Castilho, não dá para esquecer daquele senhor, que sem saber estava dando asas a nossa imaginação, cordial, educador, rígido com os palavrões, pior que uma bronca dele, era o banco de reserva, um monte de grama mais elevado que o campo, atrás da linha lateral.
Onze anos. Chuteira de cravos de couro pregado na sola, que muitas vezes meu querido e saudoso avô Henrique, consertava em sua pequena oficina. Um sonho. Uma trave para guardar. Conversa para segunda-feira no recreio da escola.
Depois do jogo, ajudava meu tio a vender melancia cortada ou laranja descascada, limonada gelada e outras vezes sorvete.
Assim como eu, vários outros meninos seguiam o mesmo caminho. O caminho do sonho de um dia ser jogador de futebol, de preferência em seu time de coração e jogar na Seleção Canarinho.
No país dessa época, cada canto do bairro tinha um campo de futebol e muitas fábricas. Só para se ter uma ideia, na Vila Anastácio tinham seis campos, uma fundição, oficinas da Estrada de Ferro Santos a Jundiaí, Anderson Clayton, Moinho da Lapa, Madeireira Guedes e Fiat Lux.
Nessa época as grandes empresas patrocinavam os times de garotos como; Fiat Lux, Matarazzo, Passoquinha Paulista, várias metalúrgicas, além dos clubes como Nacional, Ypiranga e até um Educandário Dom Duarte, aquele que revelou Moacir da Seleção Brasileira, reserva de Didi em 1958.
A única droga que conhecíamos era quando errávamos um lance, um drible ou um gol.
2015. Não há mais campos de futebol, só altos condomínios, não há Fundição, nem Fiat Lux, as oficinas da Estrada de Ferro agora pertencem a uma multinacional, não há mais Anderson Clayton, nem Moinho da Lapa. As empresas agora patrocinam os grandes clubes ou Campeonatos de Várzea, acabou o Dente de Leite da extinta TV Tupi, os meninos não vendem mais frutas ou sucos ou mesmo sorvetes, agora os meninos se envolvem com drogas, viram aviões para poder comprar roupas e tênis de marca.
Hoje, as drogas fazem parte do seu cotidiano, cocaína, cola de sapateiro, crack e até heroína, a bola agora é um saco plástico com enchimento de papéis, as traves são as grades de respiro do metrô e o campo é de cimento ou de asfalto e as chuteiras são os pares de havaianas velhas e desgastadas.
Onde estão os “Seos Castilhos”? Viraram inspetores da FEBEM ou da C.A.S.A. Nossas escolas tinham muros altos para os alunos não “matarem” aula, hoje é para não serem mortos.
Ei, governante, empresário! Troque o sonho dos efeitos das drogas pelo de ser um jogador de futebol ou pelo menos, como eu, ter boas lembranças da infância.



Kiko Zampieri

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