Eu me lembro dos anos 60 e 70, quando não via a hora de chegar o final
de semana para poder jogar futebol. Sete e meia da manhã, antes que chegassem
os times juvenis e veteranos, vestíamos nosso fardamento surrado do Corintinha
da Vila Anastácio e íamos jogar até as dez horas.
Senhor Castilho, não dá para esquecer daquele senhor, que sem saber
estava dando asas a nossa imaginação, cordial, educador, rígido com os
palavrões, pior que uma bronca dele, era o banco de reserva, um monte de grama
mais elevado que o campo, atrás da linha lateral.
Onze anos. Chuteira de cravos de couro pregado na sola, que muitas
vezes meu querido e saudoso avô Henrique, consertava em sua pequena oficina. Um
sonho. Uma trave para guardar. Conversa para segunda-feira no recreio da
escola.
Depois do jogo, ajudava meu tio a vender melancia cortada ou laranja
descascada, limonada gelada e outras vezes sorvete.
Assim como eu, vários outros meninos seguiam o mesmo caminho. O caminho
do sonho de um dia ser jogador de futebol, de preferência em seu time de
coração e jogar na Seleção Canarinho.
No país dessa época, cada canto do bairro tinha um campo de futebol e
muitas fábricas. Só para se ter uma ideia, na Vila Anastácio tinham seis
campos, uma fundição, oficinas da Estrada de Ferro Santos a Jundiaí, Anderson
Clayton, Moinho da Lapa, Madeireira Guedes e Fiat Lux.
Nessa época as grandes empresas patrocinavam os times de garotos como;
Fiat Lux, Matarazzo, Passoquinha Paulista, várias metalúrgicas, além dos clubes
como Nacional, Ypiranga e até um Educandário Dom Duarte, aquele que revelou
Moacir da Seleção Brasileira, reserva de Didi em 1958.
A única droga que conhecíamos era quando errávamos um lance, um drible
ou um gol.
2015. Não há mais campos de futebol, só altos condomínios, não há Fundição,
nem Fiat Lux, as oficinas da Estrada de Ferro agora pertencem a uma
multinacional, não há mais Anderson Clayton, nem Moinho da Lapa. As empresas
agora patrocinam os grandes clubes ou Campeonatos de Várzea, acabou o Dente de
Leite da extinta TV Tupi, os meninos não vendem mais frutas ou sucos ou mesmo
sorvetes, agora os meninos se envolvem com drogas, viram aviões para poder
comprar roupas e tênis de marca.
Hoje, as drogas fazem parte do seu cotidiano, cocaína, cola de
sapateiro, crack e até heroína, a bola agora é um saco plástico com enchimento
de papéis, as traves são as grades de respiro do metrô e o campo é de cimento
ou de asfalto e as chuteiras são os pares de havaianas velhas e desgastadas.
Onde estão os “Seos Castilhos”? Viraram inspetores da FEBEM ou da
C.A.S.A. Nossas escolas tinham muros altos para os alunos não “matarem” aula,
hoje é para não serem mortos.
Ei, governante, empresário! Troque o sonho dos efeitos das drogas pelo
de ser um jogador de futebol ou pelo menos, como eu, ter boas lembranças da
infância.
Kiko Zampieri
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