20 de fevereiro de 2007

A VITÓRIA DE VICTOR


Foi finalmente aprovada na França a extinção da pena de morte. E ao mesmo tempo foi prestada uma homenagem a Victor Hugo, um dos maiores defensores da vida e da extinção da pena de morte. O autor de Os Miseráveis, enfim venceu; demorou, mas sua verdade prevaleceu. E o seu esforço foi grande, a ponto dele escrever um livro só para defender sua idéia; o livro chama-se O Último Dia de Um Condenado, onde o escritor narra as últimas seis semanas de vida de um condenado à morte, desde a sua saída do tribunal onde foi condenado até o cadafalso. Na época (estamos falando de 1829) a obra causou polêmica, mas hoje, 178 anos depois, ele provou estar certo. Mesmo sendo muitas vezes acusado de ingênuo por sua vontade de ‘reparar’ as injustiças sociais do seu tempo. Indiscutível era sua talentosa capacidade de traduzir as fragilidades, vicissitudes e riquezas da condição humana.
Transcrevo abaixo um trecho do prefácio da edição de 1832:

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[Os que julgam e condenam dizem que a pena de morte é necessária. Primeiro porque é importante subtrair da comunidade social um membro que já a lesou e poderia lesá-la novamente. Se se tratasse apenas disso, a prisão perpétua bastaria. Para que a morte? Objetarão que se pode escapar de uma prisão. Façam melhor a sentinela. Se não acreditam na solidez das grades de ferros, como ousam ter zoológicos?
Nada de carrasco onde basta o carcereiro.
Mas, retorquirão, é preciso que a sociedade se vingue, que a sociedade puna. Nem uma coisa nem outra. Se vingar é próprio do indivíduo, punir é de Deus.
A sociedade está entre os dois, o castigo está acima dela, e a vingança, abaixo. Nada de tão grande ou de tão pequeno lhe convém. Ela não deve “punir para se vingar”; ela deve corrigir para melhorar. Transformem dessa maneira a fórmula dos criminalistas, nós a compreenderemos e a ela aderiremos.
Resta a terceira e última razão, a teoria do exemplo. É preciso dar o exemplo! É preciso assustar por meio do espetáculo do fim reservado aos criminosos, os que seriam tentados a imitá-los.
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Das duas uma:
Ou o homem que os senhores castigam não tem família, parentes, vínculo nesse mundo. E nesse caso não recebeu nem educação, nem instrução, nem cuidados para seu espírito ou para seu coração; e então com que direitos os senhores matam esse órfão miserável? Os senhores o punem pelo fator de ter em sua infância pelo solo sem estirpe e sem tutor? Os senhores lhe imputam por antecipação o isolamento em que o deixaram! De sua infelicidade os senhores fazem um crime! Ninguém o ensinou a saber o que estava fazendo. Esse homem ignora. A culpa está no seu destino, não nele. Os senhores castigam um inocente.
Ou esse homem tem uma família; e então acham que o golpe com o qual o degolam fere apenas a ele?, seu pai, sua mãe, seus filhos não sangrarão também? Não. Matando-o, os senhores decapitam toda a família. E aqui mais uma vez castigam inocentes.
Canhestra e cega penalidade que, não importando de que lado se vira, castiga um inocente!]


Seria bom se nós fizéssemos uma análise de consciência nacional. Se um país intelectualmente desenvolvido como a França levou mais de duzentos anos para extinguir a pena de morte, não significa que nós, ao cogitarmos institucionalizá-la, não estaríamos cometendo um terrível ato de involução que nos tomaria séculos de tempo e vidas preciosas para nosso progresso como nação?

Fica a pergunta
E a homenagem à vitória de Victor

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